quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Os intelectuais europeus ainda têm relevância política?


Simone de Mello

(Na foto, Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir de partida para Praga)

O intelectual ativista de esquerda entrou em extinção. Aderir aos conservadores já não é mais tabu. Mas será que engajamento político ainda é essencial para a definição de identidade do intelectual europeu?

A recente notícia de que os escritores alemães Siegfried Lenz e Martin Walser e o cabaretista Dieter Hildebrandt eram filiados ao partido nazista quando jovens abalou menos a opinião pública alemã do que a confissão que Günter Grass fez no ano passado sobre seu envolvimento com a Waffen-SS, unidade de elite do Exército de Hitler.

Mais do que o eventual comprometimento dessas figuras públicas com o regime nazista, o que realmente tomou a atenção da imprensa alemã foi a suspeita de que o partido nazista promovia filiações em massa, sem o conhecimento dos membros registrados. Os artistas na mira da opinião pública alegaram não ter conhecimento de sua filiação, e a justificativa foi aceita sem muito debate.

Pode ser que o escândalo desencadeado por Günter Grass já tenha rendido discussão suficiente e oferecido todos os argumentos para absolver as restantes figuras públicas. O assunto esgotou. Fato é que o argumento cabal para a absolvição desses artistas é sua credibilidade pessoal e o engajamento político que os tornou personalidades públicas influentes durante as últimas décadas.

Desobrigados de engajamento

O que mais chama a atenção nessa breve polêmica alemã é o apelo a valores que começam a perder a importância. É que a exigência de que o artista ou intelectual esteja do lado político "certo", que para a intelligentsia do pós-guerra sempre foi a esquerda, já deixou de ser formulada há um certo tempo. Ativismo político "correto" como garantia irrestrita de credibilidade pública: algo de que os intelectuais foram desobrigados?

Martin Walser, por exemplo, custou a reconquistar seu prestígio de literato após tê-lo colocado em risco há quase dez anos, ao reclamar da pretensa "instrumentalização do Holocausto" em um discurso proferido em 1998, em Frankfurt, por ocasião da entrega do Prêmio da Paz do Comércio Livreiro Alemão. Será que tal "deslize" ainda provocaria a mesma onda de indignação hoje?

O fato de o engajamento político ser um critério de qualidade que passou a se restringir aos intelectuais da velha guarda vem sendo aceito na Alemanha em silêncio, sem grandes debates. Na França, contudo, o desaparecimento do intelectual de esquerda tem sido registrado como uma ruptura traumática na identidade cultural coletiva. A adesão de intelectuais de esquerda, como o filósofo André Glucksmann, ao reduto do conservador Sarkozy durante as eleições presidenciais francesas causou espécie, mesmo que não tenha gerado a controvérsia esperada.

O fenômeno é descrito, em parte, como uma "virada de casaca" dos intelectuais originariamente de esquerda, fartos de pertencerem a um agrupamento político cada vez mais irrelevante. E a melhor forma de ser ouvido por quem está no poder e aumentar assim sua influência social seria aderir aos novos conservadores.

A França silencia

"A adesão ao Sr. Sarkozy simboliza a possibilidade de os intelectuais e filósofos se tornarem reacionários clássicos 'sem hesitação nem murmúrio', como diz o regimento militar", comentou o filósofo franco-marroquino Alain Badiou, em entrevista recente ao Le Monde.

E ele prossegue: "Essa adesão inclui a ligação corrompida com os ricos e os detentores de poder, a xenofobia antipopular e a adoração da política americana. Antigamente, quando um intelectual era de direita, ele tinha complexos. (...) O pós-guerra constituiu o personagem estereotipado do intelectual de esquerda. O que estamos assistindo agora – pelo menos é a isso que aspiro – é a morte do intelectual de esquerda, que entrou em declínio junto com a esquerda como um todo, antes de renascer das cinzas como uma fênix! Esse renascimento só poderá ocorrer numa clara divisão: ou um tipo novo de radicalismo político ou a adesão reacionária. Sem meio-termo."

A previsão de Badiou, filósofo que nunca se desligou de um horizonte socialista e marxista, não deixa de ter traços utópicos. Afinal, nada indica o surgimento de um novo radicalismo político entre os intelectuais europeus. A Europa como bastião de resistência à ascensão do neoconservadorismo americano: esta é uma (auto-)imagem em processo de diluição.

"Não permitamos nos entregar juntos à burrice"

A cumplicidade entre intelectuais norte-americanos e europeus parece ter morrido junto com Susan Sontag, considerada embaixadora intelectual entre os lados do Atlântico. Ao reagir com críticas aos políticos e aos órgãos de mídia norte-americanos após os atentados de 11 de setembro de 2001, Sontag se colocou na mira da opinião pública em seu país. Simbólico também o fato de ela se encontrar, naquela data, na American Academy de Berlim.

"Fiquemos de luto juntos. Mas não permitamos nos entregar juntos à burrice. Um pouco de consciência histórica poderia nos ajudar a compreender o que ocorreu e o que está por vir. 'Nosso país é forte' – é o que não param de nos dizer. Isso não necessariamente me consola. Quem duvidaria de que a América é forte? Mas força não é tudo que a América tem que mostrar agora." Essa declaração de Sontag gerou críticas ferozes nos EUA, inclusive por parte da intelectualidade.

A Europa, onde as reações ao 11 de Setembro foram mais diversificadas e emocionalmente mais distanciadas, se colocou a partir de então na posição de relativizar o radicalismo neoconservador ocidental e de compensar o silêncio – pelo menos inicial – de grande parte da intelectualidade norte-americana. Mas essa diferença também passou a se diluir nos últimos anos.

Calados ou ofuscados?

O silêncio dos intelectuais europeus domina o continente. Mas será que eles realmente se calam ou que seu chamado é ofuscado por outros discursos e pela onipresença da mídia diluidora de diferenças?

Esta última alternativa foi a explicação para a perplexidade muda com que os intelectuais italianos reagiram à era Berlusconi. Muitos observadores achavam que não era um silêncio voluntário, mas sim uma conseqüência da censura de vozes críticas na mídia televisiva controlada pelo próprio Berlusconi. Os radicais apelos de Umberto Eco, por exemplo, nunca foram televisionados.

Em um livro ironicamente intitulado Absent Minds. Intellectuals in Britain, Stefan Collini, professor de Literatura Inglesa em Cambridge, lançou – no ano passado – um perfil diferenciado do intelectual britânico do século 20. Desmentindo a suspeita de que o Reino Unido não teria intelectuais de peso, dado o pragmatismo do pensamento insulano, Collini disseca as formas de veiculação das opiniões da intelligentsia entre os redutos científicos e os meios de comunicação de massa.

Recentes discussões da sociologia alemã sobre o papel dos intelectuais parecem apontar para o desaparecimento de uma postura intelectual definitiva, como a que imperava nas décadas de 1960 e 70. A fragmentação do discurso intelectual, manifesto apenas nas brechas de um grande consenso entre política e mídia, dificulta cada vez mais sua apreensão. Ou será que o pensar complexo se torna cada vez menos comunicável numa era de informações rápidas?

"O consenso da retórica piedosa e deturpadora da realidade por parte de todos os políticos e comentadores da mídia nos últimos dias é indigno da democracia." Esta declaração, com que Susan Sontag horrorizou a opinião pública norte-americana em 2001, parece manter em certa medida a validade – e ter se estendido para além da América. Resta saber se realmente não existe nenhum meio-termo entre um novo radicalismo político e a adesão ao conservadorismo, como formulou Badiou. Ou quem sabe ainda não seja possível vislumbrar o efeito futuro de um discurso intelectual disperso e fragmentado.

TEMPO QUE FOGE

Ricardo Gondim

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para frente do que já vivi até agora. Sinto-me como aquele menino que ganhou uma bacia de jabuticabas. As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.

Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. Não tolero gabolices.

Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.

Já não tenho tempo para projetos megalomaníacos. Não participarei de conferências que estabelecem prazos fixos para reverter a miséria do mundo.

Não vou mais a workshops onde se ensina como converter milhões usando uma fórmula de poucos pontos. Não quero que me convidem para eventos de um fim-de-semana com a proposta de abalar o milênio.

Já não tenho tempo para reuniões intermináveis para discutir estatutos, normas, procedimentos parlamentares e regimentos internos. Não gosto de assembléias ordinárias em que as organizações procuram se proteger e perpetuar através de infindáveis detalhes organizacionais.

Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos. Não quero ver os ponteiros do relógio avançando em reuniões de "confrontação", onde "tiramos fatos à limpo".

Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário do coral.

Já não tenho tempo para debater vírgulas, detalhes gramaticais sutis, ou sobre as diferentes traduções da Bíblia. Não quero ficar explicando porque gosto da Nova Versão Internacional das Escrituras, só porque há um grupo que a considera herética. Minha resposta será curta e delicada: - Gosto, e ponto final!

Lembrei-me agora de Mário de Andrade que afirmou: "As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos".
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos.

Já não tenho tempo para ficar explicando aos medianos se estou ou não perdendo a fé porque admiro a poesia do Chico Buarque e do Vinicius de Moraes; a voz da Maria Bethânia; os livros de Machado de Assis, Thomas Mann, Ernest Hemingway e José Lins do Rego.

Sem muitas jabuticabas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita para a "última hora"; não foge de sua mortalidade, defende a dignidade dos marginalizados, e deseja andar humildemente com Deus.

Caminhar perto delas nunca será perda de tempo.

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

ACM, Deus e o Diabo na terra do sol

ACM, Deus e o Diabo na terra do sol
(Miguezim de Princesa)

I
Numa sessão em Angola,
O meu amigo Raimundo
Recebeu alma penada
Que num contar bem profundo
Narrou a fundo a chegada
De ACM no outro mundo.

II
Todo vestido de branco,
Pois já tinha trocado o terno,
ACM se postou
Na entrada do inferno
Para onde foi direto
A mando do Pai Eterno.

III
Carregando água de cheiro,
Viu-se um cordão de baianas
Esperando o grande líder
Numa comitiva bacana
Com mais de 100 deputados
E um cão comendo bananas.

IV
Apareceu Lúcifer:
Com um chicote na mão
E a cara muito amarrada,
Foi logo dizendo, então,
Que entre o babalaô,
Hoje tem reunião.

V
Duma grande mesa de ferro
Já foram se aproximando.
Na cabeceira da mesa,
ACM foi sentando;
Lúcifer deu um pinote
E começou protestando:

VI
- Aqui, quem manda sou eu,
Eu sou o rei da folia!
Pra comer acarajé
Tem de pedir à minha tia.
Já falei pra Juraci
Que aqui não é a Bahia!

VII
ACM não falou
Durante a reunião,
Fingiu concordar com tudo
Que viu na resolução,
Disse: "Tou com Lúcifer,
Vou apertar sua mão".

VIII
Junto com seis senadores
Começou a passear,
A cumprimentar o povo
Que encontrou no lugar,
Nas esquinas do Inferno
Desandou a discursar.

IX
Lúcifer tava dormindo,
Acordou de supetão,
Pela brecha da janela
Viu muita aglomeração
E ao redor de ACM
Toda espécie de cão.

X
"O Inferno está sem graça";
"Queremos animação";
"Lúcifer é um moleza,
Não rouba nem tem ação"
- assim pediam nas faixas
Do diabo a deposição.

XI
Lúcifer inda propôs
Dois turnos de eleição,
ACM fincou pé
Que não aceitava, não,
Pois a vontade do povo
Pedia deposição.

XII
Lúcifer sai correndo,
Pulou um grande portão,
Encontrou do outro lado
Seu amigo Lampião.
Disse: "O homem tá com a gota,
Quer fazer revolução!"

XIII
- A hora é de resistir -
Exclamou Chico Pinguelo.
- Vamos botar pra feder -
Animou-se João Tranguelo.
- ACM hoje vai ver
Como se come farelo!

XIV
Aí, começou uma guerra
(Cacete de cão com cão):
A turma de ACM
Deitou abaixo o portão,
Tinha até uma quitandeira
Com uma vassoura na mão.

XV
No exército de ACM
Se viam até generais;
Lúcifer tinha cangaceiros
Que não acabavam mais
Pra defender o portão,
Reduto de Satanás.

XVI
O grande Lucas da Feira
Se agarrou com Pinochet,
Arrancou o seu bigode
Com uma agulha de crochê,
Deu uma facada em Videla,
Botou Médici pra correr.

XVII
O Cão-Coxo de um pinote
Uma tora de pau pegou,
Zuniu a tora no vento
Chega a direção mudou,
Meteu em Garrastazu,
A tora pegou no sul
Que o norte sentiu a dor.

XVIII
ACM quase morre
Na volta de Cão-Ligeiro,
Escapou manco de uma perna
Por dentro do marmeleiro,
Escoltado por uma diaba
Com um pau de bater tempero.

XIX
Corisco acertou um tiro
No general Golbery;
Castelo Branco, com medo,
Começou fazer xixi;
Lampião disse só falta
Do nosso lado Waldir.

XX
Apareceu Costa e Silva,
Sem saber por quem lutava;
Ernesto Geisel num canto
Com Figueiredo falava,
Enquanto o Cabeça Branca
Na capoeira escapava.

XXI
Se mandou em retirada,
Pegou o caminho do Céu,
Deu um esbregue em São Pedro,
Uma bicuda em São Miguel
E ainda pirraçou
O arcanjo Gabriel.

XXII
Na porta do paraíso
Quando ACM chegou,
Ofegante e agitado,
A santidade esnobou
E disse para São Pedro:
- Não falo com assessor

XXIII
Mandaram chamar Jesus
(Quem chamou foi São Tomé),
ACM se exaltou,
Fez o maior rapapé:
- Eu só falo é com o pai dele,
Daqui não arredo pé!

XXIV
Jesus Cristo então pediu
O parecer de Maria.
Ela pensou direitinho
Enquanto o Inferno ardia:
- Se o Inferno não agüenta,
Se aqui ele não entra,
Só voltando pra Bahia.

Sólo le pido a Dios

León Gieco.


Sólo le pido a Dios
que el dolor no me sea indiferente,
que la reseca muerte no me encuentre
vacío y solo sin haber hecho lo suficiente.

Sólo le pido a Dios
que lo injusto no me sea indiferente,
que no me abofeteen la otra mejilla
después que una garra me arañó esta suerte.

Sólo le pido a Dios
que la guerra no me sea indiferente,
es un monstruo grande y pisa fuerte
toda la pobre inocencia de la gente.

Sólo le pido a Dios
que el engaño no me sea indiferente
si un traidor puede más que unos cuantos,
que esos cuantos no lo olviden fácilmente.

Sólo le pido a Dios
que el futuro no me sea indiferente,
desahuciado está el que tiene que marchar
a vivir una cultura diferente.

A propósito de um artigo de Mauro Santayana

Destaque para o:


"Há duas coisas que explicam a histeria de certos círculos da oposição. Uma delas - a principal - é o êxito da política econômica. "

Parece briga de aleijado em porta de igreja. O que espanta é a mediocridade. Êxito da política econômica???? Barriga cheia??? Onde vivem esses petistas, meu Deus??

Pensei que uma nação fosse mais que comida, dinheirinho. A felicidade dos petistas em dar esmolas é um acinte, especialmente quando lembramos que era esse gente que estufava o peito para falar em democracia, autonomia, liberdade, ética. Esmola que é a bolsa família, esmola que é a educação pública, a saúde em ruínas, todas acompanhadas de uma manipulação mesquinha que se faz isso a favor do pobre, quando na verdade o petista luta é a favor da pobreza, quer vê-la ali domesticada, servil, contente com as migalhas que o só o lulismo pode distribuir.

Eu, particularmente, sempre senti constrangimento, vergonha de ter o que comer e dormir enquanto um homem é humilhado pela falta de recursos. E essa é uma moral católica, que os anticlericais, os louvadores do mercado, os neoliberais e agora os petistas de todas as formações denunciam como atrasada para justificar a razão de não fazerem nada para acabar com isso, com esse regime usurário que tomou conta do Brasil onde se ganha quem tem, onde a exploração do trabalho virou regra e as oportunidades se distribuem de acordo com a cor da pele, o gênero, a origem familiar e a carteirinha de um partido.

Não vejo mérito na injustiça, na distribuição de renda desse país, na riqueza com a qual se contemplam os banqueiros, os políticos profissionais, os ex-sindicalistas, os pastores evangélicos. O mérito deles é deles, mas a riqueza que têm não serve para nada, não cria nada, a não ser coisas ruins ou feias ou injustas. Me fazem lembrar alguns prefeitos corruptos do interior que, na década de oitenta, encantados com o dinheiro fácil, compravam uma F-1000, um apartamento em Salvador e várias putas. Nada faziam pela municipalidade e, alguns anos depois, se perdiam as eleições, estavam todos pobres, abandonados por suas famílias, ridicularizados por onde passavam.

O poder do Lula vai passar. E não vai demorar para se ver o Lula com a cara barbada cheia de escarros, cuspes e vômitos por onde passe, assim como ocorre com os ACMs, os Luiz Estêvão, os Jáders da vida.

Os petistas são os novos malufistas, os novos carlistas, os verdadeiros direitistas. São os filhos do Golbery, de fato.

Esmolés, assim falávamos dos miseráveis perambulando nas feiras de Central. Esse argumentos do Mauro Santayana são de um esmolé moral. Não sou definitivamente um animal lulista e principalmente maurosantayanista.... mas lá vou eu falar de valores: coragem, ética, criatividade, arte, prazer, invenção.

Entre Hitler, com o seu sucesso econômico, e Itamar Franco com a atriz sem calcinha ao seu lado, fico com o último, lamentando essa bajulação fácil ao Lula, uma figura torpe não pelo erros que demonstra, mas pelos valores que carrega consigo.

Portanto, Vade Retro, Lula!!!!

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Eloquência

Faço alusão ainda à frase de A. Karr que diz que "a botânica é arte de secar as plantas entre folhas de papel e injuriá-las em grego e latim". Para mim, o jornalismo tem sido a arte de secar a verdade entre folhas de papel e injuriá-la em português mesmo".

Chega de eloquência banal.

Cristo e o sacrifício


Encontrei na TV Comunitária uma entrevista com um intitulado "físico e teosofista", aparentemente indiano, de nome Ravi Ravindra falando de Jesus Cristo. Fiquei impressionado com a explanação do guru. Creio que ia ao encontro das opiniões católicas. Fez alusão a anedota dos rabinos que interpretam que o povo judeu foi eleito pelo Senhor para sofrer, não para gozar de um privilégio especial. "Todas as nações foram chamadas a obedecer a Deus e somente os judeus foram tolos o suficiente para aceitar".

Daí o físico passou a dissertar sobre o significado do sacrifício (tornar sagrado, mediante um sofrimento consciente) e também ressaltou que amar a Cristo e fazer com que ele se revele para nós, pressupõe que nós o obedeçamos, cumpramos seus mandamentos. O filho, ressalta Ravindra, mostra que ama o pai quando o obedece e, mais que amor, Cristo pede essa sujeição, esse sacrifício, exemplificado com sua morte na cruz. "Não me parece que Deus queira de nós um sentimento morno, sem paixão. Esse tipo de gente, está lá nas escrituras, serão dispensadas", diz o teosofista.

João Cabral de Mello Neto


O zapin me trouxe a notícia da morte de João Cabral de Mello Neto. Havia uma entrevista do Pedro Bial com ele na Globo News. Sofrível, já que o entrevistado falava de menos e Bial, de mais. Mais sofrível ainda que ele, sincero demais, mostrava como estava debilitado.
_ O senhor se incomoda de "Morte e Vida Severina" um poema feito por encomenda ser a sua obra mais conhecida?
_ Não, não me incomodo. Não acho que seja a melhor coisa que fiz, mas isso não me incomoda.
_ Como é o seu dia-a-dia?
_ Fico o dia todo ouvindo a CBN, já que não posso enxergar.
_ O Brasil dói?
_ Só quando estive fora. Quando estou no Brasil o que dói é Pernambuco.
_ Fazendo uma alusão a Drummond que dizia que Minas não há mais, ainda há Pernabumco?
_ Há, há sim. Apesar de toda a modernidade o interior e Recife estão lá, não mudaram quase nada.
_ O senhor tem algum pensamento que o persegue?
_ Não.
_ Sabe um poema seu ou de outrem de cor?
_ Não.
_ Tem medo da morte?
_ Tenho sim, principalmente do inferno de que falava os padres do colégio Marista. Eu sou um materialista, mas tenho medo do inferno.

Carlitos


O controle remoto me levava por alguns instantes a um documentário na GNT sobre Chaplin, que me arrancou uma risada gostosa como há tempo não dava. Nesse caso, tratava-se de uma cena onde Carlitos acompanhava um jogador de golfe míope que por diversas vezes não acertava a bolinha. Por três vezes ele mostra ao jogador que a bola não saíra do lugar até que perde a paciência, finge acompanhar a trajetória da bola que dá um giro no ar, volta e cai novamente onde nunca havia saído.

Apaixonado


Estou apaixonado por outra. Estou aprisionado e o sentimento aumentou no último final de semana quando assisti "Por quem os Sinos Dobram". De cabelo curto, fazendo o papel da filha de um prefeito republicano assinado por nacionalistas durante a guerra civil espanhola. Ela e aquele sorriso, a expressão maior do sonho estético aristotélico e da poética romântica. Intocável e etérea... A última vez que tive um acesso apaixonado desses foi por Marisa Monte, linda, a voz mais linda do mundo. A paixão esvaneceu-se no segundo trabalho dela: como uma voz tão boa, uma mulher tão bela se punha a cantar umas cançõezinhas daquelas. O estrago provocado teve o mesmo efeito que os vícios e as manias descobertas num relacionamento a dois: não são suficientes para afastar a quem se ama, mas apagam a luz dos olhos. Mas com ela, a belíssima atriz, não. O segundo trabalho dela e ela não me decepcionou. Linda, os sorriso mais lindo com a voz mais doce e o olhar mais meigo que passou por este planeta. Ave Ingrid Bergman...

Panacéias


Considero ingenuidade pensar que educação, saúde e reforma agrária sejam a panacéia para o desenvolvimento econômico, social e cultural do País. Lembro-me de Fernando Pessoa citando aquele que sofria com as injustiças do mundo, com o fato de uns tantos com fome enquanto outros com tanto para comer. E o poeta considerava que não sabia se era fome de comida ou da sobremesa alheia.... Essa indignação fácil e preguiçosa cansa-me tanto... Por isso que prezo muito os militantes, todos eles: sejam evangélicos, macrobióticos, petistas ou esotéricos. O que os deixa indignados são gentes que como eu nos fartamos de defender idéias, proclamar ideais e alimentarmo-nos de utopias absolutamente distintas das nossa atitude de vida e dos nossos valores. Na política, o voto e o blablablá. Na religião, o blablablá e o dízimo (quando há).

Ensino Superior

Ainda sobre educação pública. Os maiores responsáveis pelo descalabro do ensino superior é a própria comunidade acadêmica, que piora a cada dia. E de onde menos se espera daí é que não vem nada mesmo. Cobrança de mensalidade no ensino superior no Brasil deve ser idéia de louco. A exemplo da Espanha, o sujeito deveria ser pago para estudar neste país.

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Futebol

Tô torcendo para o flamengo cair para a segundona e o Corithians anunciar sua falência. Só assim para arranjarem um proer para os clubes, acabarem com os pontos corridos e trazer o Bahia de volta para a primeirona.

Jesus Cristo: Messias Literário

Li, recentemente, um texto que busca demonstrar que o messianismo de Cristo não é verdadeiro. Acho interessante a abordagem e a discussão bastante esclarecedora. O cristianismo é a uma religião textual, onde os textos procuram dialogar entre si e com os outros, daí porque acho no mínimo razoável o apelo que a Igreja faz à Tradição. O problema é que os textos trazem subtextos, furos e contradições que obrigam o leitor a construir também a obra. A esse respeito, Umberto Eco tem uma obra espetacular, Lector in Fabula, que tão bem cabe à análise exegética. Daí porque, o cristianismo é uma religião literária em pura essência, o que torna brilhantes as abordagens de Kazatzankis (é assim que se escreve?) na Última Tentação de Cristo, Saramago no Evangelho sobre Jesus Cristo e, porque não? Monty Pithon em A Vida de Brian.

É claro que o catolicismo não seria o mesmo sem Agostinho (que eu, particularmente, acho filosófica e humanamente venerável), Tomás de Aquino (idem), Santa Teresa D´Ávila. Mas seria ainda mais pobre sem a força narrativa das imagens e da literatura. Da Vinci, Sheakespeare, Garcia Marques, Ariano Suassuana têm em seu DNA justamente a capacidade de diálogo narrativo que a cosmovisão cristão não negou aos seus filhos, mesmo com todo o índex da Igreja nem todo o calvinismo protestante.

Daí o horror que me causa a estupidez dos iconoclastas e a ignorância daqueles que tentaram fazer do texto bíblico uma obra fechada, como a última e definitiva edição do jornal de Deus. Tô fora! e daí reconheço a força do argumento que tenta "desconstruir" o messianismo cristão.

Mas isso muda algo em minha crença cristã? Não. Porque a beleza do cristianismo reside tanto no texto como no seu pre-texto. "Creio para entender e entendo para crer" é um axioma que um papa, acho que João XXIII, estabeleceu para encararmos o texto bíblico, sustentando que ele exige um respeito de nós e para nós mesmos, os vivos que debruçamos sobre eles e os mortos que o experimentaram primeiro.

sexta-feira, 20 de julho de 2007

O Globo deu, na semana passada, uma matéria informando que a classe média fazia a farra em cinemas e shows com carteirinhas estudantis de araque. Eu nem preciso, que em Brasília os professores (inclusive os limitados como eu) recebem a meia-entrada. Se bem que acabo parei da dar aulas...

Terei que fazer um curso no wisdow.

Lutei contra isso na época que a meia-entrada foi aprovada, se bem que hoje não me interessa esse assunto. Os adolescentes deveriam ser mandados todos para um internato e só sair de lá quando acabassem as espinhas e a voz tivesse 20 decibéis abaixo do nível que apresentam.

Aos 36 anos, lidar com crianças é algo divertido, com adolescentes é insuportável, com velhos é imprevisível e, com os de nossa faixa... impossível.

A única coisa que eu peço ao pessoal do PC do B é que além de deficiente e velho arranjem um jeito de reservar vaga em estacionamento de Brasília para baiano, meio careca e meio obeso. São décadas de preconceito!!!

A carteirinha vale a pena para os "estudantes" assistirem Shrek e jamais perder o Ratatui, que também é genial.

Tragédia da TAM

E, quanto ao acidente da TAM.... nada dá mais para discutir de quem é a culpa e o valor das desculpas. Nem mais uma palavra depois das "declarações" do ministro avulso e seu jornalista assessor. Os dois tão nobres e cheios de sentimentos encerram a tragédia e qualquer possibilidade de se falar nela.

Lulismos

Para aqueles que ficaram afetados quando o FHC disse, com toda razão, que um funcionário público que se aposenta aos 45 anos é um vagabundo.

Para aqueles que ficaram indignados quando Ciro Gomes disse que a mulher dele teria como tarefa em seu governo dormir com ele.

Para aqueles que se indignaram com o "estupra, mas não mata" de Maluf.

Para aqueles que....

Enfim.

O Lulismo para os lulistas....



A VIDA NÃO VALE NADA?
.
http://www.youtube.com/watch?v=wW-ptpYQ1Ds

Dialogo com uma amicíssima, que me fala que um dos seus projetos é a culinária judaica. Comida para mim é mais importante forma de perversão e da comida judaica só tinha ouvido falar do manjar que Deus mandou dos céus e os hebreus acabaram enjoando o sabor.

Doutor House



No final das contas, estamos em sintonia. Meu herói predileto nos últimos tempos é o Doutor Gregory House, um médico narcista, grosso, obcecado, viciado em remédios e absolutamente genial. Tirando a genialidade, identifiquei-em de imediato com a misantropia do personagem. O lema de House: "Todo mundo mente". Ele acha os pacientes intoleráveis e chama seus subordinados de lacaios e capachos. Por que cargas d'água fui me interessar por um personagem tipo assim? A série, que a record tá passando às sextas-feiras, fala de medicina, mas mais especialmente das relações de poder dentro de um grupo humano, que não muito diferente numa padaria, no partido político ou dentro de casa. E, para sobreviver a essas relações, é preciso ter uma alta dose de crueldade ou de cinismo. Eu prefiro ainda a crueldade.

terça-feira, 3 de abril de 2007

Do ex-blog do César Maia: AMÉRICA LATINA: ENSINO UNIVERSITÁRIO, MUITO, MUITO LÁ EMBAIXO!

Coluna de Rosendo Fraga em La Nacion do dia 24 de janeiro de 2007. Resumo.

01. O ranking mundial de Universidades realizado pelo diário The Times mostra apenas uma Universidade da América Latina entre as 200 melhores do mundo. É a Universidade Autônoma do México, que ocupa o lugar 74 (é isso mesmo setenta e quatro). Depois, no lugar 500 aparece a Universidade Austral da Argentina, seguida depois pelas Universidades Católicas do Chile e do Peru. Só as Universidades Africanas ficaram em lugar pior que as latino-americanas.

02. As Exportações da América Latina alcançaram 650 bilhões de dólares em 2006, graças à valorização das matérias primas. As Exportações da Bolívia cresceram 46%; do Peru 37%; do Equador 27%; da Venezuela 26%; do México 20%; do Uruguai 20%; do Brasil 16%; da Colômbia 15%; da Argentina 14% e do Paraguai 13%.

03. Entre 1980 e 2002 a América Latina cresceu 2,2% ao ano. Há três anos cresce mais que 4% e ano passado cresceu 5,3%. O maior crescimento foi de Cuba com 12%. Depois Venezuela 10%, e em terceiro Argentina com 8,5%. Uruguai, Colômbia e Peru cresceram acima da média. Bolívia e Equador cresceram 5%. México cresceu 4,8%. O crescimento mais baixo foi o do Brasil com 2,8%.

04. A Indigência -menos de 1 dólar diário por pessoa- alcança 14,7% da população ou 79 milhões de pessoas. Em 2005 havia sido 15,4% caindo, portanto 0,7%.

05. A penetração da Internet em toda a região alcançou no fim de 2006, 16% da população. É exatamente a média mundial, mas os paises mais pobres da Ásia aumentam a penetração da Rede em forma mais acelerada.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Sinaes

Há quatro anos trabalhando no ensino superior e, finalmente, decobrimos que o MEC trabalha. Eles lançaram um revolucionário, moderno, super-eficiente CADASTRO de professores pela Internet!!!!! É a primeira medida que o MEC toma que afeta diretamente a vida dos professores nas instituições privadas....

E o ministro (qual é mesmo o nome dele? Afinal, de onde ele é? O que ele faz da vida, mesmo?) está de parabéns. Não fez a reforma universitária, não fez o Fundeb, não inventou a roda... É a melhor maneira do setor avançar.

A TESE DO COELHO


Essa é a verdadeira história daqueles a que Paulo Francis chamava de "analfabetos com Phd". No final, tente localizar onde está o Estado. O que a horda de servos que lhe prestam vassalagem tem preparado de tese de doutorado no campo da comunicação não é brincadeira.


Era um dia lindo e ensolarado o coelho saiu de sua toca com o notebook e
pôs-se a trabalhar, bem concentrado.

Pouco depois passou por ali a raposa, e, viu aquele suculento coelhinho tão
distraído, que chegou a salivar.
No entanto, ficou intrigada com a atividade do coelho e aproximou-se,
curiosa:

- Coelhinho, o que você está fazendo aí, tão concentrado?

- Estou redigindo a minha tese de doutorado - disse o coelho, sem tirar os
olhos do trabalho.

- Hummmm... e qual é o tema da sua tese?

- Ah, é uma teoria provando que os coelhos são os verdadeiros predadores
naturais das raposas.

A raposa ficou indignada:
-Ora!!! Isso é ridículo!!! Nós é que somos os predadores dos coelhos!

- Absolutamente! Venha comigo à minha toca que eu mostro a minha prova
experimental.

- O coelho e a raposa entram na toca.

Poucos instantes depois ouve-se alguns ruídos indecifráveis, alguns poucos
grunhidos e depois silêncio.

Em seguida, o coelho volta, sozinho, e mais uma vez retoma os trabalhos de
sua tese, como se nada tivesse acontecido.
Meia hora depois passa um lobo. Ao ver o apetitoso coelhinho, tão distraído,
agradece mentalmente à cadeia alimentar por estar com o seu jantar garantido

No entanto, o lobo também acha muito curioso um coelho trabalhando naquela
concentração toda.
O lobo resolve então saber do que se trata aquilo tudo, antes de devorar o
coelhinho:

- Olá, jovem coelhinho! O que o faz trabalhar tão arduamente?

- Minha tese de doutorado, seu lobo. É uma teoria que venho desenvolvendo há
algum tempo e que prova que nós, coelhos, somos os grandes predadores
naturais de vários animais carnívoros, inclusive dos lobos.

O lobo não se conteve e farfalha de risos com a petulância do coelho.
- Ah, ah, ah, ah!!! Coelhinho! Apetitoso coelhinho! Isso é um despropósito;
nós os lobos, é que somos os genuínos predadores naturais dos coelhos.

-Aliás, chega de conversa...

- Desculpe-me, mas se você quiser eu posso apresentar a minha prova
experimental. Você gostaria de acompanhar-me à minha toca?

O lobo não consegue acreditar na sua boa sorte.
Ambos desaparecem toca adentro. Alguns instantes depois ouve-se uivos
desesperados, ruídos de mastigação e ... silêncio.

Mais uma vez o coelho retorna sozinho, impassível, e volta ao trabalho de
redação da sua tese, como se nada tivesse acontecido.

Dentro da toca do coelho vê-se uma enorme pilha de ossos ensangüentados e
pelancas de diversas ex-raposas e, ao lado desta, outra pilha ainda maior de
ossos e restos mortais daquilo que um dia foram lobos.

Ao centro das duas pilhas de ossos, um enorme leão, satisfeito, bem
alimentado, a palitar os dentes.
MORAL DA HISTÓRIA:

1. Não importa quão absurdo é o tema de sua tese;
2. Não importa se você não tem o mínimo fundamento científico;
3. Não importa se as suas experiências nunca cheguem a provar sua teoria;
4. Não importa nem mesmo se suas idéias vão contra o mais óbvio dos
conceitos lógicos.
5. O que importa é QUEM É O SEU PADRINHO.......

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Galeanices

De te fabula narratur: "A injustiça social não é um erro
por corrigir, nem um defeito por superar: é uma necessidade
essencial."
Quem? Eduardo Galeano

Império do consumo e da estupidez

A Ley de Murphy é implacável: De onde menos se espera daí é que não vem nada mesmo.


Eduardo Galeano
A explosão do consumo no mundo atual faz mais barulho do que todas as guerras e mais algazarra do que todos os carnavais. Como diz um velho provérbio turco, aquele que bebe a conta, fica bêbado em dobro. A gandaia aturde e anuvia o olhar; esta grande bebedeira universal parece não ter limites no tempo nem no espaço.
Mas a cultura de consumo faz muito barulho, assim como o tambor, porque está vazia; e na hora da verdade, quando o estrondo cessa e acaba a festa, o bêbado acorda, sozinho, acompanhado pela sua sombra e pelos pratos quebrados que deve pagar.

A cultura do consumo é o mesmo que a cultura da caminhada, a cultura do almoço, a cultura do sono, a cultura do xixi.... o consumo, até onde me alcança é um ato integrante até de uma cultura....


A expansão da demanda se choca com as fronteiras impostas pelo mesmo sistema que a gera. O sistema precisa de mercados cada vez mais abertos e mais amplos tanto quanto os pulmões precisam de ar e, ao mesmo tempo, requer que estejam no chão, como estão, os preços das matérias primas e da força de trabalho humana. O sistema fala em nome de todos, dirige a todos sua imperiosas ordens de consumo, entre todos espalha a febre compradora; mas não tem jeito: para quase todo o mundo esta aventura começa e termina na telinha da TV. A maioria, que contrai dívidas para ter coisas, termina tendo apenas dívidas para pagar suas dívidas que geram novas dívidas, e acaba consumindo fantasias que, às vezes, materializa cometendo delitos. O direito ao desperdício, privilégio de poucos, afirma ser a liberdade de todos.

A expansão da demanda, vejam só, não é um conceito que se aplique sem que se leve em conta o discurso e os demais conceitos econômicos.O Galeano tem vergonha de dar nome ao sistema. Qual sistema, cara pálida? O capitalista? E que mistura louca é essa que começa com a expansão da demanda, vai para o consumismo impulsionado pela telinha de TV e pára nas dívidas. Quem tem dívida, ô Galeano, é quem tem crédito... os inadimplentes padecem por um problemas que eles mesmo provocam e, pasmem, são uma "imensa minoria".


Dize-me quanto consomes e te direi quanto vales. Esta civilização não deixa as flores dormirem, nem as galinhas, nem as pessoas. Nas estufas, as flores estão expostas à luz contínua, para fazer com que cresçam mais rapidamente. Nas fábricas de ovos, a noite também está proibida para as galinhas. E as pessoas estão condenadas à insônia, pela ansiedade de comprar e pela angústia de pagar. Este modo de vida não é muito bom para as pessoas, mas é muito bom para a indústria farmacêutica. Os EUA consomem metade dos calmantes, ansiolíticos e demais drogas químicas que são vendidas legalmente no mundo; e mais da metade das drogas proibidas que são vendidas ilegalmente, o que não é uma coisinha à-toa quando se leva em conta que os EUA contam com apenas cinco por cento da população mundial.

Infere-se das contas do Galeano que todo americano ou está dopado ou está drogado. Como é que eles conseguem manter o complexo-industrial-militar-consumista de sua economia crescendo mais que o Brasil, onde o presidente não toma cachaça e só tem petista diligente e laborioso trabalhando?

«Gente infeliz, essa que vive se comparando», lamenta uma mulher no bairro de Buceo, em Montevidéu. A dor de já não ser, que outrora cantava o tango, deu lugar à vergonha de não ter. Um homem pobre é um pobre homem. «Quando não tens nada, pensas que não vales nada», diz um rapaz no bairro Villa Fiorito, em Buenos Aires. E outro confirma, na cidade dominicana de San Francisco de Macorís: «Meus irmãos trabalham para as marcas. Vivem comprando etiquetas, e vivem suando feito loucos para pagar as prestações».

Os pobres latinos se sentem diminuídos porque não têm roupas de marca. Não sei por que, eu, nordestino, que cresci vestindo roupa de feira livre sobrevivi às teses do Galeano.


Invisível violência do mercado: a diversidade é inimiga da rentabilidade, e a uniformidade é que manda. A produção em série, em escala gigantesca, impõe em todas partes suas pautas obrigatórias de consumo. Esta ditadura da uniformização obrigatória é mais devastadora do que qualquer ditadura do partido único: impõe, no mundo inteiro, um modo de vida que reproduz seres humanos como fotocópias do consumidor exemplar.

O Galeano entende muito de economia. Acho que a produção em série de produtos é mais opressiva que a ditadura de Fidel Castro, o regime soviético, a vida na Coréia do Norte, esses lugares onde existe o partido único. Alguém precisa dar a ele uma foto de um supermercado comunista... ou melhor uma foto da antiga Cobal, da SAB ou da Cesta do Povo, para ele enteder o que é uniformização....

O consumidor exemplar é o homem quieto. Esta civilização, que confunde quantidade com qualidade, confunde gordura com boa alimentação. Segundo a revista científica The Lancet, na última década a «obesidade mórbida» aumentou quase 30% entre a população jovem dos países mais desenvolvidos.

O consumidor exemplar é quieto? hahahah.. Uma pesquisa que faz parte de qualquer beabá de marketing mostra que o consumidor amplia em 10 vezes as reclamações contra um mau serviço e apenas duas vezes a de um bom. Tõ fazendo minha parte com o Galeano. Ele traz os números: O aumento de 30% mostra que toda a CIVILIZAÇÃO (judaico-cristã-ocidental) confunde o que é uma comida.


Entre as crianças norte-americanas, a obesidade aumentou 40% nos últimos dezesseis anos, segundo pesquisa recente do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Colorado. O país que inventou as comidas e bebidas light, os diet food e os alimentos fat free, tem a maior quantidade de gordos do mundo. O consumidor exemplar desce do carro só para trabalhar e para assistir televisão. Sentado na frente da telinha, passa quatro horas por dia devorando comida plástica.

Bingo!! Galeano descobriu que o consumidor exemplar trabalha.


Vence o lixo fantasiado de comida: essa indústria está conquistando os paladares do mundo e está demolindo as tradições da cozinha local. Os costumes do bom comer, que vêm de longe, contam, em alguns países, milhares de anos de refinamento e diversidade e constituem um patrimônio coletivo que, de algum modo, está nos fogões de todos e não apenas na mesa dos ricos. Essas tradições, esses sinais de identidade cultural, essas festas da vida, estão sendo esmagadas, de modo fulminante, pela imposição do saber químico e único: a globalização do hambúrguer, a ditadura do fast food. A plastificação da comida em escala mundial, obra do McDonald´s, do Burger King e de outras fábricas, viola com sucesso o direito à autodeterminação da cozinha: direito sagrado, porque na boca a alma tem uma das suas portas.

Morte ao MacDonald's! Viva o Xinxim de Galinha!


A Copa do Mundo de futebol de 1998 confirmou para nós, entre outras coisas, que o cartão MasterCard tonifica os músculos, que a Coca-Cola proporciona eterna juventude e que o cardápio do McDonald´s não pode faltar na barriga de um bom atleta. O imenso exército do McDonald´s dispara hambúrgueres nas bocas das crianças e dos adultos no planeta inteiro. O duplo arco dessa M serviu como estandarte, durante a recente conquista dos países do Leste Europeu.

Alguém invadiu o Leste Europeu e eu não fiquei sabendo???? O Galeano tá tomando ansiolítico de americano.

As filas na frente do McDonald´s de Moscou, inaugurado em 1990 com bandas e fanfarras, simbolizaram a vitória do Ocidente com tanta eloqüência quanto a queda do Muro de Berlim. Um sinal dos tempos: essa empresa, que encarna as virtudes do mundo livre, nega aos seus empregados a liberdade de filiar-se a qualquer sindicato. O McDonald´s viola, assim, um direito legalmente consagrado nos muitos países onde opera. Em 1997, alguns trabalhadores, membros disso que a empresa chama de Macfamília, tentaram sindicalizar-se em um restaurante de Montreal, no Canadá: o restaurante fechou. Mas, em 98, outros empregados do McDonald´s, em uma pequena cidade próxima a Vancouver, conseguiram essa conquista, digna do Guinness.

Ok... Ele se desmente para melhorar o argumento. Viva o Guiness!


As massas consumidoras recebem ordens em um idioma universal: a publicidade conseguiu aquilo que o esperanto quis e não pôde.
Qualquer um entende, em qualquer lugar, as mensagens que a televisão transmite. No último quarto de século, os gastos em propaganda dobraram no mundo todo. Graças a isso, as crianças pobres bebem cada vez mais Coca-Cola e cada vez menos leite e o tempo de lazer vai se tornando tempo de consumo obrigatório. Tempo livre, tempo prisioneiro: as casas muito pobres não têm cama, mas têm televisão, e a televisão está com a palavra. Comprado em prestações, esse animalzinho é uma prova da vocação democrática do progresso: não escuta ninguém, mas fala para todos.

Os dados do Galeano são tão estapafúrdios que chegam a ser trágicos. Milhões de mães pobres de pobres Galeanos no mundo inteiro, depois de trocar o leito pela coca cola, não vão mais dar mais arroz com feijão pro meninos, que vão passar a comer, por módicos R$ 10 diários, um bigmac. E eu, sinceramente, não entendi a "vocação democrática do progresso: não escuta ninguém, mas fala para todos".


Pobres e ricos conhecem, assim, as qualidades dos automóveis do último modelo, e pobres e ricos ficam sabendo das vantajosas taxas de juros que tal ou qual banco oferece. Os especialistas sabem transformar as mercadorias em mágicos conjuntos contra a solidão. As coisas possuem atributos humanos: acariciam, fazem companhia, compreendem, ajudam, o perfume te beija e o carro é o amigo que nunca falha. A cultura do consumo fez da solidão o mais lucrativo dos mercados.

De novo.. a cultura do consumo.


Os buracos no peito são preenchidos enchendo-os de coisas,
ou sonhando com fazer isso. E as coisas não só podem
abraçar: elas também podem ser símbolos de ascensão social,
salvo-condutos para atravessar as alfândegas da sociedade
de classes, chaves que abrem as portas proibidas. Quanto
mais exclusivas, melhor: as coisas escolhem você e salvam
você do anonimato das multidões. A publicidade não informa
sobre o produto que vende, ou faz isso muito raramente.
Isso é o que menos importa. Sua função primordial consiste
em compensar frustrações e alimentar fantasias. Comprando
este creme de barbear, você quer se transformar em quem?

A publicidade, fiquem estarrecidos, nunca informou.


O criminologista Anthony Platt observou que os delitos das
ruas não são fruto somente da extrema pobreza. Também são
fruto da ética individualista. A obsessão social pelo
sucesso, diz Platt, incide decisivamente sobre a
apropriação ilegal das coisas. Eu sempre ouvi dizer que o
dinheiro não trás felicidade; mas qualquer pobre que
assista televisão tem motivos de sobra para acreditar que o
dinheiro trás algo tão parecido que a diferença é assunto
para especialistas.

Ou seja, todo crime cometido por pobres está justificado, não Galeano? De quem é a mente doentia? Do criminoso ou de quem o justifica?

Segundo o historiador Eric Hobsbawm, o século XX marcou o
fim de sete mil anos de vida humana centrada na
agricultura, desde que apareceram os primeiros cultivos, no
final do paleolítico. A população mundial torna-se urbana,
os camponeses tornam-se cidadãos. Na América Latina temos
campos sem ninguém e enormes formigueiros urbanos: as
maiores cidades do mundo, e as mais injustas. Expulsos pela
agricultura moderna de exportação e pela erosão das suas
terras, os camponeses invadem os subúrbios.

Eu saí do interior porque quis, atrás de oportunidades. Acreditem-me, eu não fui expulso por ninguém.


Eles acreditamque Deus está em todas partes, mas por experiência própria
sabem que atende nos grandes centros urbanos.

Fazer chacota com a fé alheia, essa fé ingênua de camponeses.


As cidades prometem trabalho, prosperidade, um futuro para
os filhos. Nos campos, os esperadores olham a vida passar,
e morrem bocejando; nas cidades, a vida acontece e chama.
Amontoados em cortiços, a primeira coisa que os recém
chegados descobrem é que o trabalho falta e os braços
sobram, que nada é de graça e que os artigos de luxo mais
caros são o ar e o silêncio.

Blá, blá, blá... As cidades oferecem educação e saúde e renda, fruto do trabalho. Até a classe média brasiliense, que reclama da invasão nordestina (minoria, aliás, entre os migrantes), deveria saber que ninguém deixaria a Bahia e o Piauí atrás de um lote, se junto com ele não tivesse a oportunidade de melhores condições de vida, escola, hospital.... essas coisas pequeno-burguesas.


Enquanto o século XIV nascia, o padre Giordano da Rivalto
pronunciou, em Florença, um elogio das cidades. Disse que
as cidades cresciam «porque as pessoas sentem gosto em
juntar-se». Juntar-se, encontrar-se. Mas, quem encontra com
quem? A esperança encontra-se com a realidade? O desejo,
encontra-se com o mundo? E as pessoas, encontram-se com as
pessoas?Se as relações humanas foram reduzidas a relações
entre coisas, quanta gente encontra-se com as coisas?
O mundo inteiro tende a transformar-se em uma grande tela
de televisão, na qual as coisas se olham mas não se tocam.
As mercadorias em oferta invadem e privatizam os espaços
públicos.

Que discursinho, hein!. As pessoas se encontram nas cidades, sim, onde há vida nas comunidades religiosos, nos cafés, nos bares, nas reuniões familiares. Alguém convida esse sujeito para um churrasco, por favor..


Os terminais de ônibus e as estações de trens, que até
pouco tempo atrás eram espaços de encontro entre pessoas,
estão se transformando, agora, em espaços de exibição
comercial. O shopping center, o centro comercial, vitrine
de todas as vitrines, impõe sua presença esmagadora. As
multidões concorrem, em peregrinação, a esse templo maior
das missas do consumo. A maioria dos devotos contempla, em
êxtase, as coisas que seus bolsos não podem pagar, enquanto
a minoria compradora é submetida ao bombardeio da oferta
incessante e extenuante. A multidão, que sobe e desce pelas
escadas mecânicas, viaja pelo mundo: os manequins vestem
como em Milão ou Paris e as máquinas soam como em Chicago;
e para ver e ouvir não é preciso pagar passagem. Os
turistas vindos das cidades do interior, ou das cidades que
ainda não mereceram estas benesses da felicidade moderna,
posam para a foto, aos pés das marcas internacionais mais
famosas, tal e como antes posavam aos pés da estátua do
prócer na praça.

No passado, ninguém fazia fotos em frente a uma loja famosa. Era tão boa aquela época, não??? Alguém precisa apresentar a rodoforroviária e a ferroviária do Plano Piloto para esse sujeito.


Beatriz Solano observou que os habitantes dos bairros
suburbanos vão ao center, ao shopping center, como antes
iam até o centro. O tradicional passeio do fim-de-semana
até o centro da cidade tende a ser substituído pela
excursão até esses centros urbanos. De banho tomado,
arrumados e penteados, vestidos com suas melhores galas, os
visitantes vêm para uma festa à qual não foram convidados,
mas podem olhar tudo. Famílias inteiras empreendem a viagem
na cápsula espacial que percorre o universo do consumo,
onde a estética do mercado desenhou uma paisagem alucinante
de modelos, marcas e etiquetas.

No Conjunto Nacional ou no Parkshopping?


A cultura do consumo, cultura do efêmero, condena tudo à
descartabilidade midiática. Tudo muda no ritmo vertiginoso
da moda, colocada à serviço da necessidade de vender. As
coisas envelhecem num piscar de olhos, para serem
substituídas por outras coisas de vida fugaz. Hoje, quando
o único que permanece é a insegurança, as mercadorias,
fabricadas para não durar, são tão voláteis quanto o
capital que as financia e o trabalho que as gera. O
dinheiro voa na velocidade da luz: ontem estava lá, hoje
está aqui, amanhã quem sabe onde, e todo trabalhador é um
desempregado em potencial.
Paradoxalmente, os shoppings centers, reinos da fugacidade,
oferecem a mais bem-sucedida ilusão de segurança. Eles
resistem fora do tempo, sem idade e sem raiz, sem noite e
sem dia e sem memória, e existem fora do espaço, além das
turbulências da perigosa realidade do mundo.
Os donos do mundo usam o mundo como se fosse descartável:
uma mercadoria de vida efêmera, que se esgota assim como se
esgotam, pouco depois de nascer, as imagens disparadas pela
metralhadora da televisão e as modas e os ídolos que a
publicidade lança, sem pausa, no mercado.

Os donos do mundo??? Quem, os capitalistas ferozes assassinos?


Mas, para qual outro mundo vamos nos mudar? Estamos todos obrigados a
acreditar na historinha de que Deus vendeu o planeta para
umas poucas empresas porque, estando de mau humor, decidiu
privatizar o universo? A sociedade de consumo é uma
armadilha para pegar bobos.

Deus vendeu o mundo? Dá plantão nas cidades? O Deus do Galeano é privatista e "malumorado".


Aqueles que comandam o jogo fazem de conta que não sabem
disso, mas qualquer um que tenha olhos na cara pode ver que
a grande maioria das pessoas consome pouco, pouquinho e
nada, necessariamente, para garantir a existência da pouca
natureza que nos resta. A injustiça social não é um erro
por corrigir, nem um defeito por superar: é uma necessidade
essencial. Não existe natureza capaz de alimentar um
shopping center do tamanho do planeta.

De te fabula narratur: "A injustiça social não é um erro
por corrigir, nem um defeito por superar: é uma necessidade
essencial.".. Sem essa injustiça social, de quê viveriam os Galeanos?



Tradução: Verso Tradutores

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Simone Iwasso, o máximo

Uma repórter com um post desses é brilhante. Orgulho do jornalismo. Espero que aproveitem tanto quanto eu, por isso reproduzo na íntegra, com todos os links.

"Tem gente que chama de jornalismo literário, outros preferem jornalismo narrativo, na prática tudo acaba sendo resumido como matéria especial. Em inglês, a referência ainda é new jornalism e na américa hispânica, cronicas periodisticas. Mas isso é o que menos importa. O bacana, para quem ainda acha que jornalismo tem esperança e pode ser bem feito, é que existem algumas revistas inspiradíssimas que propagam boas reportagens escritas maravilhosamente bem por pessoas que sabem o que estão fazendo. E, a vantagem para nós, é que pelo menos algumas delas têm parte de seu conteúdo acessível online. Além da clássica New Yorker, referência em todo o mundo, na América Latina existe a Etiqueta Negra, uma revista mensal editada no Peru com textos de colaboradores que incluem tipos como Gay Talese, Eduardo Galeano, Ryszard Kapuscinski, John Lee Anderson, entre vários outros. A revista chama atenção pela qualidade do texto, pela criatividade nas histórias (cada edição é temática e gira em torno de um assunto), pela ousadia nas abordagens e também pelo cuidado gráfico. O triste é que não chega aqui no Brasil. Também entre os hermanos, na Colômbia é editada El Malpensante, outra experiência bem boa, mas que infelizmente não libera os textos na internet. No Chile, uma outra proposta, que mistura num formato pasquim putaria com grandes reportagens investigativas é The Clinic, que começou quase como um fanzine distribuído na época em que Pinochet estava internado na Europa. Atualmente, é uma publicação quinzenal que ganhou respeito e credibilidade, sem deixar de ser engraçada e com cara de feita quase artesanalmente. Pena que não temos nada do tipo por aqui - quem sabe, talvez, um dia, a Piauí."

Para exercer o jornalismo

O texto, achei-o no NoMínimo no ótimo blog da Carla Rodrigues que o encontrou "no ótimo blog da repórter Simone Iwasso. É sobre um grande jornalista, o polonês Ryszard Kapuscinski, morto no último dia 24 de janeiro, que definiu assim a profissão":

"Creio que para exercer o jornalismo, antes de tudo, há de ser um bom homem ou uma boa mulher: bons seres humanos. Más pessoas não podem ser bons jornalistas. Se se é uma boa pessoa, se pode tentar compreender as demais, suas intenções, sua fé, seus interesses, suas dificuldades, suas tragédias. E converter-se, imediatamente, desde o primeiro momento, em parte de seu destino. É uma qualidade que a psicologia denomina “empatia”. Mediante a empatia, se pode compreender o caráter próprio do interlocutor e compartilhar de forma natural e sincera o destino e os problemas dos demais. Nesse sentido, o único modo correto de fazer nosso trabalho é desaparecer, esquecermos de nossa existência. Existimos somente como indivíduos que existem para os demais, que compartilham com eles seus problemas e tentam resolvê-los, ou ao menos descrevê-los. O verdadeiro jornalismo é intencional, a saber: aquele que fixa um objetivo e tenta provocar algum tipo de mudança. Não há outro jornalismo possível. Falo, obviamente, do bom jornalismo."

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Lê, Eleusa

Se há algo que diz aquilo que esconde
a vida comum, cotidiana, arquiteta,
Do Plano Piloto, da seca urbana
É esse parabéns de homem distraído
Que sou desde que te vi
E tenho sido

Que não há como concentrar atenção
Em nada de datas, em horas mesquinhas
Quando com ganas lutas e vences
As circunstâncias que a tantos derrubariam

E mostras que heroísmo é destino
Não de quem quer, mas só dos que amam
Que mesmo que caiam, que sofram, que penem
Têm almas erigidas num altar divino

Mulher que ri com risada feliz
Me conta como nada abala esta crença
Não de igrejas, nem deuses, nem ciências
Mas da vida vivida como um grande poema

Se há algo que diz aquilo que mostra
a vida plena, supreendente, criativa
Desta Brasília banhada de amores
É a tua lembrança de amiga atenta
Que foste desde então
E continuas sendo

Carta maior, jornalismo menor

Não sei se a Agência Carta Maior só ouve petistas e aí minha reclamação é vazia. Mas não posso deixar de comentar a matéria com Ricardo Carneiro (Unicamp) e João Sicsú (UFRJ), na qual os dois economistas "vêem como positiva a mudança da orientação ortodoxa na economia." O argumento é simples: "Embora haja muitas questões em aberto, o PAC busca recolocar o planejamento nas mãos do poder público."

o problema é que a desonestidade jornalística é uma ofensa grave. Ricardo Carneiro é economista filiado ao PT e Sicsú, embora não seja filiado, admite ter "uma forte ligação" com o partido. Basta uma pesquisa no google para colocar a opinião dos dois no devido lugar: propaganda partidária. Esse pessoal da Carta Maior poderia trabalhar um pouco melhor, não?

Chico Alencar, do PSOL

Muito boa, oportuna e inteligente as colocações do ex-petista e ainda comunista Chico Alencar em entrevista à Agência Câmara. Há, como dizia o Mário Henrique Simonsen, constatações novas e interessantes na entrevista. O problema é que as novas não são interessantes e as interessantes não são novas. E, nesse caso, dominam as platitudes acacianas, os paradoxos e inconsistência de argumentos, típico da falta de raciocínio honesto sobre os temas que é convidado a opinar. Percebo ainda um certo vazio de substância: o sujeito defende "uma reeducação política dos parlamantes" (lobotomia??), diz que Lula é refém (oh, coitado!!) e que vai fazer uma oposição "propositiva, programática e pela esquerda", que é o mesmo que dizer coisa nenhuma. Lula pode ir dormir sossegado - e o País ficar insone - com uma oposição dessas, já que - last but dont least - "os setores mais conservadores que fazem parte do Governo Lula" não vão deixar passar a reforma política.

sábado, 27 de janeiro de 2007

Senhor Presidente da República

Um mentiroso contumaz lá no Planalto
Repete a exaustão que é um democrata
Tem uma lábia infernal de pederasta
E voz de barítono e de contralto

O cara crê no céu, isso não malho
O pé na cozinha e a alma que se ata
No candomblé enquanto o culto exalta
Reforça que é mentiroso pra caralho

Não importa a ninguém que ande nu
E que rei se sinta o atrevido
Nem que se ache o próprio onipresente

O que não pode é tomar no cu
O povo que sustenta o convencido
E o que quer, fantasiado ou não, só presidente

Distância

Saudade que o mundo não sufoca
Quem é louco de não lhe dar ouvidos
Mesmo que as coisas percam o sentido
O amor vem bater-nos a nossa porta

Escrevo-te! Embora não tenha alegrias
Para contar-te e falar do meu mundo
Para prometer-te um tanto de tudo
Restaram as penas do meu dia-a-dia

Meus ombros doem dores estranhas
Minha cabeça pulsa outra dor ainda
Meu tempo se esvai entre tantos problemas:

Dinheiro, carreira, sonhos, destino,
Estou sufocado em tantos dilemas.
Cadê teu sorriso, que me fez menino?

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Inspirado em teu depoimento

Aquele verso que não lembramos
Torna-se vivo nos sentimentos
Por mais que resista ao momento.
As palavras ficam onde estamos

Perdidos sem saber o que viria.
Virá sem quem da hora dê conta
Que o destino por si só não apronta
Sabes: não é só o sol que faz o dia!

Pois é preciso um passo que revele
O caminho que se quer e se aprecia
Como a chuva também é da primavera

Pois o verso que se sabe poesia
Encaixa em som e forma, e se esmera
Como o corpo se revela em tua pele

Gloria in Excelsis


Dominus dedit, Dominus abstulit, sit nomen Domini benedictum

Para ti

O mundo enlouquecido diante dos olhos...
Por que brigam e para que lutam os heróis
Se tudo que vemos já está perdido no mar
da incompreensão

A vida bagunçada diante dos sonhos...
Por que clamam por justiça os corajosos
Se tudo que vivemos já está perdido no mar
da desilusão

O amor entristecido diante dos desejos...
Por que choram e por que gritam os amantes
Se tudo o que sentimos já está perdido no mar
da solidão

Ora, mas isso é com os pessimistas
E estes sim é que estão perdidos
E estão loucos e entristecidos
Por que inventaram mares e se afogaram neles

Navegar navegamos em um oceano de quimeras,
de momentos, de sentimentos, de projetos,
de realidades, de amores, de idéias,
de princípios, de alegrias, de poesias

E voltemos aos sonhos, e vivamos a vida
Que os amantes de águas sabem tudo
Porque se afogam todo dia
Porque se embebedam a toda hora
Porque se lavam a cada minutona paixão.
E essa é a água de todo os oceanos...

No Corcovado


É preciso determinar a finalidade de tudo isso. Não sei porque vim parar aqui nesta cidade. Subi até o Cristo Redentor nessa manhã. Foi um espetáculo visual sem precedente em toda a minha vida. O Rio de Janeiro é de uma beleza descomunal, estonteante. Fui num trenzinho onde o burburinho provocado pelo buchicho da turistada estrangeira quase atrapalhava a vista. Ao meu lado o som de vozes um tanto gutural fazia supor uma língua eslava. Quase todos de olhos azuis e todos os sentados muito brancos. Negro, o motorista. E o moreno aqui, de turista incidental, era atravessado por olhares entre curiosos, pretensiosos ou apáticos.

A compleição de alguns, de bochechas inchadas e dominadas pelo vermelhão, revela o cansaço que é essa tarefa de conhecer os lugares do mundo para contar a aventura tantas vezes dessinteressante a ouvidos muitas vezes desinteressados. Sinto pena quando vejo um destacamento de turistas, pois me fazem lembrar tropas militares que perderam o rumo da batalha, a noção da guerra e o interesse pela vitória. Havia entre eles aquela desconfiança miúda de quem está prestes a ser assaltado, enganado ou, simplesmente, ridicularizado.

Eu, da minha parte, carregava o mesmo receio antes de colocar os pés pelo calçadão de Copacabana. Não demorou 10 minutos para descobrir que minha pele, meu caminhado e, especialmente, a maneira despreocupada com que olhava para o mar, tornava-me mais carioca que os moradores daquele bairro. Senti uma satisfação, uma paz comigo mesmo, como alguém que acaba de despedir uma visita indesejada. Não me ofereceram nenhuma buginganga de verão, badulaques inúteis como óculos de sol, toalhas, sucos e sanduíches; nem mesmo o artesanato pobre dos hippies profissionais, nem as camisetas dos camelôs.

Eu sorri para mim e daqueles estrangeiros incomodados pela gentileza mercantil dos ambulantes. Mas, nessa hora, no Corcovado, não me vem esse humor. Ao chegar lá em cima sinto, de imediato, o choque visual e um mal estar absurdo. Ânsia de vômito e uma dor no peito. Penso em infarte. Lembro o João Pedro e agradeço a Deus por, pelo menos, ver esse espetáculo todo. A Baía de Guanabara gira sobre a minha cabeça. Recosto no alpendre maravilhado com aquela visão e nervoso ao sentir as pernas bambas. O João Pedro não sai de minha cabeça e também o fato de pedir a Deus para que eu realmente tenha perdoado aquela mulher com quem casei.

Minhas pernas fraquejaram. Respiro fundo e recobro um pouco de consciência das coisas, da paisagem, enquanto tento me convencer que o mal estar é por causa do café, a pressão atmosférica daquela altura toda ou por aquela beleza inexplicável. Sinto-me melhor, mas receio que os turistas estejam todos olhando, penalizados, para mim. Nem de longe. Diante daquelas pedras imensas quem iria olhar para a feiúra de um ser humano?

Pronto!, já posso cumprir a tarefa de ver o que é para ser visto. Olho para a imagem do Cristo e falo com Ele o que nós, humanos, fizemos aquele monumento espetacular em Sua homenagem. Viro as costas e, dentro de mim, surge uma resposta para minha fala pretensiosa: “E Eu, que fiz isso, para vocês?”
_ Fotos! Fotos! Só dez reais!
Pela milésima vez perco um debate com o criador... Pelo menos o fotógrafo achou um jeito de lucrar com os préstimos divinos.

Domino-me. E a altura imensa parece convidar-me para um vôo sobre aquilo tudo. Um helicóptero circunda pipocando flashes sobre nós turistas. Um espaço perto do Leblon, todo branco, chamou muito a minha atenção. Supus um bairro popular construído por encomenda por algum governante obcecado por dar aos pobres um dormitório típico de hospício. Casinhas iguais, brancas, ficam bonitas de longe. Novamente, tomo noção da altura em que estou olhando para a floresta da Tijuca, embaixo do Cristo. Se eu cometer suicídio, acho que não faria falta a ninguém no final das contas.

Não queria viver assim, sem sentidos e sem maiores sentimentos. O meu entusiasmo com o jornalismo, a minha fé católica, apostólica e romana, a minha esperança infantil esvaem. Existem duas expressões, pobres aliás, para se referir a momentos assim. A primeira, aquela dos covardes, é quando se diz que se sente um vazio. A outra, dos idiotas, diz-se estar cheio disso tudo. Eu penso em suicídio e no abandono. Sumir da vida que eu levo na Capital do País. Minhas veias estão cheias, minha vidinha cheia. Minha idéias flutuam, meu coraçãozinho há muito que carrega um sopro típico de cardíaco.

Preciso ir-me. Esses velhos da classe média mundial, garotos da Canon, da Nike, da Siemens e outras tantas marcas,- seja pelo trabalho que lhes paga, ou pelo consumo que lhes realiza - estão me sufocando. Desço e espero uns 10 minutos até o retorno do trenzinho do Corcovado. Vou ao banheiro, urino. Abro a portinhola e sou surpreendido com o sorriso nervoso de uma idosa japonesa.

Entro no vagão vermelho da frente e cinco minutos depois agradeço pelo grupo de samba não ter subido no mesmo. A batucada profissional ficou lá atrás e foi até a metade do caminho. Na minha frente um vermelho americano e, sentada ao meu lado, provavelmente, a mulher dele. Silêncio no vagão, interrompido pela vai e vem de um japonês que fotograva a estradinha. Abro a carteira, pego a foto do meu filho. As lágrimas saem e esqueço a paisagem, a viagem e a mim mesmo. Reparo que a americana me olha com descrição e não me sinto incomodado mais.

Quando deixo a estação para trás deparo-me com a Igreja de São Judas Tadeu. Entro. Tento rezar enquanto a missa termina. Faço tudo isso de maneira automática, inclusive pegar o táxi uns 15 minutos depois. Não sinto nada de fato. Um torpor invadiu-me o corpo. Cansaço, desânimo. Até que passo por aquilo que julgava uma casinhas brancas de um projeto de habitação governamental. É um cemitério, meu Deus do céu! Cheio de imagens brancas de Nossa Senhora, de tumbas brancas. O táxi passa rápido. Sinto-me melhor, penso que tenho que sacar dinheiro, que não sei onde fica a agência do Banco do Brasil, que não sei a que distância estou de Copacabana, que preciso ver o horário do vôo para ir embora para Brasília, que quero ver o meu filho.