terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Lê, Eleusa

Se há algo que diz aquilo que esconde
a vida comum, cotidiana, arquiteta,
Do Plano Piloto, da seca urbana
É esse parabéns de homem distraído
Que sou desde que te vi
E tenho sido

Que não há como concentrar atenção
Em nada de datas, em horas mesquinhas
Quando com ganas lutas e vences
As circunstâncias que a tantos derrubariam

E mostras que heroísmo é destino
Não de quem quer, mas só dos que amam
Que mesmo que caiam, que sofram, que penem
Têm almas erigidas num altar divino

Mulher que ri com risada feliz
Me conta como nada abala esta crença
Não de igrejas, nem deuses, nem ciências
Mas da vida vivida como um grande poema

Se há algo que diz aquilo que mostra
a vida plena, supreendente, criativa
Desta Brasília banhada de amores
É a tua lembrança de amiga atenta
Que foste desde então
E continuas sendo

Carta maior, jornalismo menor

Não sei se a Agência Carta Maior só ouve petistas e aí minha reclamação é vazia. Mas não posso deixar de comentar a matéria com Ricardo Carneiro (Unicamp) e João Sicsú (UFRJ), na qual os dois economistas "vêem como positiva a mudança da orientação ortodoxa na economia." O argumento é simples: "Embora haja muitas questões em aberto, o PAC busca recolocar o planejamento nas mãos do poder público."

o problema é que a desonestidade jornalística é uma ofensa grave. Ricardo Carneiro é economista filiado ao PT e Sicsú, embora não seja filiado, admite ter "uma forte ligação" com o partido. Basta uma pesquisa no google para colocar a opinião dos dois no devido lugar: propaganda partidária. Esse pessoal da Carta Maior poderia trabalhar um pouco melhor, não?

Chico Alencar, do PSOL

Muito boa, oportuna e inteligente as colocações do ex-petista e ainda comunista Chico Alencar em entrevista à Agência Câmara. Há, como dizia o Mário Henrique Simonsen, constatações novas e interessantes na entrevista. O problema é que as novas não são interessantes e as interessantes não são novas. E, nesse caso, dominam as platitudes acacianas, os paradoxos e inconsistência de argumentos, típico da falta de raciocínio honesto sobre os temas que é convidado a opinar. Percebo ainda um certo vazio de substância: o sujeito defende "uma reeducação política dos parlamantes" (lobotomia??), diz que Lula é refém (oh, coitado!!) e que vai fazer uma oposição "propositiva, programática e pela esquerda", que é o mesmo que dizer coisa nenhuma. Lula pode ir dormir sossegado - e o País ficar insone - com uma oposição dessas, já que - last but dont least - "os setores mais conservadores que fazem parte do Governo Lula" não vão deixar passar a reforma política.

sábado, 27 de janeiro de 2007

Senhor Presidente da República

Um mentiroso contumaz lá no Planalto
Repete a exaustão que é um democrata
Tem uma lábia infernal de pederasta
E voz de barítono e de contralto

O cara crê no céu, isso não malho
O pé na cozinha e a alma que se ata
No candomblé enquanto o culto exalta
Reforça que é mentiroso pra caralho

Não importa a ninguém que ande nu
E que rei se sinta o atrevido
Nem que se ache o próprio onipresente

O que não pode é tomar no cu
O povo que sustenta o convencido
E o que quer, fantasiado ou não, só presidente

Distância

Saudade que o mundo não sufoca
Quem é louco de não lhe dar ouvidos
Mesmo que as coisas percam o sentido
O amor vem bater-nos a nossa porta

Escrevo-te! Embora não tenha alegrias
Para contar-te e falar do meu mundo
Para prometer-te um tanto de tudo
Restaram as penas do meu dia-a-dia

Meus ombros doem dores estranhas
Minha cabeça pulsa outra dor ainda
Meu tempo se esvai entre tantos problemas:

Dinheiro, carreira, sonhos, destino,
Estou sufocado em tantos dilemas.
Cadê teu sorriso, que me fez menino?

sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Inspirado em teu depoimento

Aquele verso que não lembramos
Torna-se vivo nos sentimentos
Por mais que resista ao momento.
As palavras ficam onde estamos

Perdidos sem saber o que viria.
Virá sem quem da hora dê conta
Que o destino por si só não apronta
Sabes: não é só o sol que faz o dia!

Pois é preciso um passo que revele
O caminho que se quer e se aprecia
Como a chuva também é da primavera

Pois o verso que se sabe poesia
Encaixa em som e forma, e se esmera
Como o corpo se revela em tua pele

Gloria in Excelsis


Dominus dedit, Dominus abstulit, sit nomen Domini benedictum

Para ti

O mundo enlouquecido diante dos olhos...
Por que brigam e para que lutam os heróis
Se tudo que vemos já está perdido no mar
da incompreensão

A vida bagunçada diante dos sonhos...
Por que clamam por justiça os corajosos
Se tudo que vivemos já está perdido no mar
da desilusão

O amor entristecido diante dos desejos...
Por que choram e por que gritam os amantes
Se tudo o que sentimos já está perdido no mar
da solidão

Ora, mas isso é com os pessimistas
E estes sim é que estão perdidos
E estão loucos e entristecidos
Por que inventaram mares e se afogaram neles

Navegar navegamos em um oceano de quimeras,
de momentos, de sentimentos, de projetos,
de realidades, de amores, de idéias,
de princípios, de alegrias, de poesias

E voltemos aos sonhos, e vivamos a vida
Que os amantes de águas sabem tudo
Porque se afogam todo dia
Porque se embebedam a toda hora
Porque se lavam a cada minutona paixão.
E essa é a água de todo os oceanos...

No Corcovado


É preciso determinar a finalidade de tudo isso. Não sei porque vim parar aqui nesta cidade. Subi até o Cristo Redentor nessa manhã. Foi um espetáculo visual sem precedente em toda a minha vida. O Rio de Janeiro é de uma beleza descomunal, estonteante. Fui num trenzinho onde o burburinho provocado pelo buchicho da turistada estrangeira quase atrapalhava a vista. Ao meu lado o som de vozes um tanto gutural fazia supor uma língua eslava. Quase todos de olhos azuis e todos os sentados muito brancos. Negro, o motorista. E o moreno aqui, de turista incidental, era atravessado por olhares entre curiosos, pretensiosos ou apáticos.

A compleição de alguns, de bochechas inchadas e dominadas pelo vermelhão, revela o cansaço que é essa tarefa de conhecer os lugares do mundo para contar a aventura tantas vezes dessinteressante a ouvidos muitas vezes desinteressados. Sinto pena quando vejo um destacamento de turistas, pois me fazem lembrar tropas militares que perderam o rumo da batalha, a noção da guerra e o interesse pela vitória. Havia entre eles aquela desconfiança miúda de quem está prestes a ser assaltado, enganado ou, simplesmente, ridicularizado.

Eu, da minha parte, carregava o mesmo receio antes de colocar os pés pelo calçadão de Copacabana. Não demorou 10 minutos para descobrir que minha pele, meu caminhado e, especialmente, a maneira despreocupada com que olhava para o mar, tornava-me mais carioca que os moradores daquele bairro. Senti uma satisfação, uma paz comigo mesmo, como alguém que acaba de despedir uma visita indesejada. Não me ofereceram nenhuma buginganga de verão, badulaques inúteis como óculos de sol, toalhas, sucos e sanduíches; nem mesmo o artesanato pobre dos hippies profissionais, nem as camisetas dos camelôs.

Eu sorri para mim e daqueles estrangeiros incomodados pela gentileza mercantil dos ambulantes. Mas, nessa hora, no Corcovado, não me vem esse humor. Ao chegar lá em cima sinto, de imediato, o choque visual e um mal estar absurdo. Ânsia de vômito e uma dor no peito. Penso em infarte. Lembro o João Pedro e agradeço a Deus por, pelo menos, ver esse espetáculo todo. A Baía de Guanabara gira sobre a minha cabeça. Recosto no alpendre maravilhado com aquela visão e nervoso ao sentir as pernas bambas. O João Pedro não sai de minha cabeça e também o fato de pedir a Deus para que eu realmente tenha perdoado aquela mulher com quem casei.

Minhas pernas fraquejaram. Respiro fundo e recobro um pouco de consciência das coisas, da paisagem, enquanto tento me convencer que o mal estar é por causa do café, a pressão atmosférica daquela altura toda ou por aquela beleza inexplicável. Sinto-me melhor, mas receio que os turistas estejam todos olhando, penalizados, para mim. Nem de longe. Diante daquelas pedras imensas quem iria olhar para a feiúra de um ser humano?

Pronto!, já posso cumprir a tarefa de ver o que é para ser visto. Olho para a imagem do Cristo e falo com Ele o que nós, humanos, fizemos aquele monumento espetacular em Sua homenagem. Viro as costas e, dentro de mim, surge uma resposta para minha fala pretensiosa: “E Eu, que fiz isso, para vocês?”
_ Fotos! Fotos! Só dez reais!
Pela milésima vez perco um debate com o criador... Pelo menos o fotógrafo achou um jeito de lucrar com os préstimos divinos.

Domino-me. E a altura imensa parece convidar-me para um vôo sobre aquilo tudo. Um helicóptero circunda pipocando flashes sobre nós turistas. Um espaço perto do Leblon, todo branco, chamou muito a minha atenção. Supus um bairro popular construído por encomenda por algum governante obcecado por dar aos pobres um dormitório típico de hospício. Casinhas iguais, brancas, ficam bonitas de longe. Novamente, tomo noção da altura em que estou olhando para a floresta da Tijuca, embaixo do Cristo. Se eu cometer suicídio, acho que não faria falta a ninguém no final das contas.

Não queria viver assim, sem sentidos e sem maiores sentimentos. O meu entusiasmo com o jornalismo, a minha fé católica, apostólica e romana, a minha esperança infantil esvaem. Existem duas expressões, pobres aliás, para se referir a momentos assim. A primeira, aquela dos covardes, é quando se diz que se sente um vazio. A outra, dos idiotas, diz-se estar cheio disso tudo. Eu penso em suicídio e no abandono. Sumir da vida que eu levo na Capital do País. Minhas veias estão cheias, minha vidinha cheia. Minha idéias flutuam, meu coraçãozinho há muito que carrega um sopro típico de cardíaco.

Preciso ir-me. Esses velhos da classe média mundial, garotos da Canon, da Nike, da Siemens e outras tantas marcas,- seja pelo trabalho que lhes paga, ou pelo consumo que lhes realiza - estão me sufocando. Desço e espero uns 10 minutos até o retorno do trenzinho do Corcovado. Vou ao banheiro, urino. Abro a portinhola e sou surpreendido com o sorriso nervoso de uma idosa japonesa.

Entro no vagão vermelho da frente e cinco minutos depois agradeço pelo grupo de samba não ter subido no mesmo. A batucada profissional ficou lá atrás e foi até a metade do caminho. Na minha frente um vermelho americano e, sentada ao meu lado, provavelmente, a mulher dele. Silêncio no vagão, interrompido pela vai e vem de um japonês que fotograva a estradinha. Abro a carteira, pego a foto do meu filho. As lágrimas saem e esqueço a paisagem, a viagem e a mim mesmo. Reparo que a americana me olha com descrição e não me sinto incomodado mais.

Quando deixo a estação para trás deparo-me com a Igreja de São Judas Tadeu. Entro. Tento rezar enquanto a missa termina. Faço tudo isso de maneira automática, inclusive pegar o táxi uns 15 minutos depois. Não sinto nada de fato. Um torpor invadiu-me o corpo. Cansaço, desânimo. Até que passo por aquilo que julgava uma casinhas brancas de um projeto de habitação governamental. É um cemitério, meu Deus do céu! Cheio de imagens brancas de Nossa Senhora, de tumbas brancas. O táxi passa rápido. Sinto-me melhor, penso que tenho que sacar dinheiro, que não sei onde fica a agência do Banco do Brasil, que não sei a que distância estou de Copacabana, que preciso ver o horário do vôo para ir embora para Brasília, que quero ver o meu filho.